Em novembro do ano passado, o Brasil perdeu uma das maiores divas da música, Gal Costa. A morte da estrela da MPB culminou em uma série de homenagens – inclusive o filme “Meu Nome é Gal“, cuja estreia está marcada para setembro –, mas também abriu uma caixa de pandora sobre os bastidores de sua vida.
Nesta quinta-feira (6), a revista Piauí divulgou uma matéria bombástica que analisou o relacionamento da cantora com a empresária Wilma Petrillo. A reportagem, assinada pelo jornalista Thallys Braga, ouviu amigos, ex-funcionários e o irmão da artista, e revelou uma série de acusações contra a viúva de Gal. Entre elas, assédio moral, ameaças e golpes financeiros que teriam levado a baiana à falência.
Golpe, ameaças sobre orientação sexual
O primeiro depoimento da matéria é do médico Bruno Prado. Segundo ele, seu primeiro encontro com o casal foi quando tinha 31 anos. Muito fã da cantora, ele foi autorizado por Wilma a entrar no camarim de um show em São Paulo. A conexão foi imediata e eles desenvolveram uma amizade. Com o tempo, ele e Petrillo passaram a trocar confidências e, um dia, ele se sentiu à vontade para revelar que estava apaixonado por outro homem, mas não podia falar de sua sexualidade para sua família. “Ser gay era o segredo da minha vida, meus pais não podiam nem sonhar”, disse ele em entrevista à Piauí.
Anos mais tarde e cada vez mais próximos, o médico relatou que Wilma o procurou preocupada com o fato de não ter dinheiro para realizar uma cirurgia na vista. Ela pediu um empréstimo de R$ 15 mil, mas a dívida não foi paga no prazo prometido. Na mesma época, começaram a surgir boatos de que a mulher teria aplicado golpes em outras pessoas e que amigos de Gal até preferiam manter distância da empresária. A partir daí, Petrillo teria começado uma série de ameaças, o que deixou o rapaz surpreso.
Mais de dois anos se passaram e o médico não recebeu o montante de volta. Pelo contrário. Bruno afirmou que ela se recusava a pagar a dívida e o intimidava. “‘Se você continuar me cobrando, eu vou fazer uma coisa muito bonitinha: conto pro teu pai que você é viado’. Quando ela falou isso, eu tremi”, relembrou ele. Por fim, o profissional de saúde decidiu escreveu um email para Gal contando toda a história.
Depois do inconveniente, a dívida foi paga, mas Wilma cumpriu a promessa e enviou para o consultório do pai de Bruno um envelope com uma foto dele beijando o namorado. Felizmente, seus pais reagiram bem e o acolheram. Mesmo assim, as ameaças teriam continuado: “Ela dizia coisas como: ‘você não tem vergonha de pedir dinheiro para uma mulher mais velha, sua bicha?’ e ‘Você vai tomar uma surra tão bonita que vai aprender a respeitar os outros’”. Mais tarde, ele fez um boletim de ocorrência e nunca mais falou com Gal ou Petrillo.
Boicotes, assédio moral e falência financeira
Outro relato compartilhado pela revista foi do produtor Ricardo Frugoli. Ele afirmou que Gal chegou a perder várias oportunidades na carreira por causa da comportamento de Wilma. Após escutar reclamações de outros funcionários da artista, Ricardo alegou ter contato tudo para Gal, mas a estrela teria ficado furiosa com a ideia de que poderia estar sendo boicotada por conta da conduta da mulher.
“Durante muito tempo, fui o cara que não deixou a bomba explodir. Continuar ali era importante para protegê-la do que vinha acontecendo na carreira e dentro de casa”, disse o produtor. Ele alegou que continuou no trabalho por consideração à Gal, mas foi demitido quatro dias depois de fazer um boletim de ocorrência contra Wilma por ameaças.
De acordo com os 13 entrevistados, a cantora viveu com a condição financeira apertada durante o período em que se relacionou com Petrillo. Segundo eles, as dívidas iam de restaurantes, a mensalidades da escola de Gabriel (filho de Gal), pagamentos de empregados e até à Receita Federal dos Estados Unidos. Os amigos da artista apontaram que Wilma não podia voltar ao país por ter vendido um imóvel em território norte-americano e retornado ao Brasil sem pagar os impostos da transação.
A matéria revelou esse foi um dos motivos da cantora diminuir a quantidade de shows nos EUA. “Na próxima vez que ligarem, diga que a Gal não gosta de se apresentar nos Estados Unidos”, teria dito sobre um convite para uma apresentação no Carnegie Hall, em Nova York. “É mentira”, rebateu Gal ao saber do comentário.
Um dos funcionários que trabalhou com a veterana detalhou uma discussão entre as duas que teria chegado à agressão física. “O dinheiro entra e some, as dívidas não param de chegar. Que tipo de empresária é você?”, questionou Gal. “Você é uma velha, as pessoas não querem mais te contratar”, alfinetou Wilma. O profissional ainda disse que Gal afirmou não poder se separar, pois se largasse Wilma, “ela leva metade de tudo que eu tenho, sem nunca ter trabalhado de verdade para conseguir alguma coisa”.
O produtor Rodrigo Bruggermann, responsável pela organização dos shows de “Recanto” nas cidades do sul do Brasil, disse que Wilma foi “a pior pessoa com quem lidei nesse meio”. “Além de ser grosseira, ela fazia mudanças de última hora e aplicava taxas surpresa”, recordou, supondo que Gal não fazia participação especial em show de amigos porque a empresária não autorizava. “Provavelmente nem deixava os convites chegarem até ela”, lamentou.
Já o empresário Maurício Pessoa relembrou que, em 2013, conseguiu um patrocínio de R$ 700 mil da Natura Musical para uma sequência de seis shows da cantora e gravação de um álbum ao vivo, mas o acordo só foi fechado depois que Petrillo recebeu os 80% de adiantamento que exigiu. Mesmo com o pagamento, as apresentações só saíram do papel em 2015, depois de muita insistência. “Wilma sempre dizia que a agenda da Gal estava apertada”, relembrou.
O álbum, no entanto, nunca viu a luz do dia, já que ninguém apareceu no estúdio na data combinada e Wilma parou de responder às mensagens. O resultado foi a perda do patrocínio e um prejuízo de mais de R$ 1 milhão para Pessoa.
Essa ainda não teria sido a primeira vez que a empresária fazia algo do tipo. O produtor cultural Cleber Lopes Pereira contou que Wilma demandou o adiantamento de duas parcelas prévias de 15 mil reais para um show. Um dia, a empresária ligou exigindo a primeira parcela antes da assinatura dos papéis. Quando Pereira pediu o contrato assinado, ela teria dito: “Meu amor, você não está lidando com qualquer cantora, estamos falando de Gal Costa. Eu não vou assinar um contrato sem depósito prévio”.
Sem dinheiro, o produtor decidiu vender o carro e fez o depósito. Porém, a empresária deixou de atender seus telefonemas pouco depois. “Nesse ponto, eu já me sentia como se tivesse caído num golpe de estelionato”, disse Pereira. Sem o contrato assinado, o local do evento cancelou a reserva.
Afastamento de amigos e família
Os atritos constantes teriam feito com que muitas pessoas próximas a artista ficassem distantes. Entre elas, a atriz Sonia Braga que, de acordo com o relatado na reportagem, teria sido vítima de um golpe da empresária quando as duas namoravam, antes da empresária conhecer Gal. Petrillo, que sempre ficou distante da imprensa, foi descrita pelo diretor de cinema Fabiano Canosa, parceiro de longa data de Braga, como “uma mulher de extrema beleza e enorme poder de sedução, mas sem o caráter que a gente aprecia nos amigos”.
“Nunca conheci alguém como essa mulher. Falava bem, projetava uma beleza interior, uma calma, um espírito quase zen. Você caía igual patinho. Ela tinha uma maneira civilizada de aplicar golpes, tinha paciência, era uma pessoa bem orquestrada. E ninguém ousava denunciar a Wilma porque não queria se associar a uma pessoa tão… psicótica”, continuou Canosa.
Outra figura importante que não participou da vida de Gal nos últimos anos de sua vida foi seu próprio irmão, Guto Burgos, também por conta de Petrillo. Ele a acusou de ter causado o afastamento da irmã em 1997. Guto ainda citou oito salas comerciais no Rio de Janeiro, que rendiam aluguéis para a renda do casal, uma cobertura e um apartamento em um condomínio de luxo na Praia de São Conrado, no Rio de Janeiro. “Também tinha imóveis em Salvador, Trancoso e Nova York. Como dói saber que ela morreu sem nada disso. Parece que todo o trabalho dela foi em vão”, lamentou ele.
O irmão chegou a explicar como Gal e Petrillo se conheceram: “Sempre que íamos à casa da Sonia Braga, tinha essa mulher desconhecida que morava com ela. Gal não simpatizava, mas respeitava. Se era amiga da Sonia, só podia ser gente de bem”. Contudo, o romance teria começado de verdade anos depois, no início da década de 90, quando Wilma trombou com a cantora em um voo e lhe enviou uma garrafa de champanhe. Quando o avião pousou, Petrillo disse que não tinha onde ficar na cidade, e Gal a chamou para se hospedar em sua casa.
As testemunhas confirmaram que o ciúme de Wilma atrapalhou a relação de Gal com a atriz Lúcia Veríssimo, amiga e ex-namorada da cantora, e a médium Halu Gamashi. Halu confessou que tinha o costume de se encontrar com a amiga às escondidas e que, um dia, chegou a ouvir a empresária humilhando a esposa por causa de seu peso. “Você está pensando que é quem, Nana Caymmi?”, teria dito.
Em março de 2022, funcionários da companhia de energia elétrica foram até o apartamento do casal com uma ordem de corte de luz. A revista explicou que as contas do imóvel ainda estavam no nome da antiga proprietária, a artista visual Daniela Cutait. “Meu nome ficou negativado porque a Wilma não pagou as dívidas. Quando eu liguei para pedir que a titularidade da conta fosse atualizada, ela disse que eu era uma p*tinha. Uma p*tinha que morava num apartamentozinho qualquer. Você acha que eu gostei de cortar a luz da Gal Costa? Claro que não, mas foi a saída que restou”, narrou Cutait. Segundo ela, a briga continua até hoje porque a conta de gás ainda não foi regularizada.
Conflitos no enterro
Com a morte de Gal, Guto pediu para que sua irmã fosse enterrada no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro, ao lado da mãe, onde comprou um jazigo perpétuo. No entanto, Petrillo não teria permitido que o desejo da cantora fosse realizado, e decidiu que o corpo ficaria em São Paulo, no mausoléu da família dela, no Cemitério da Consolação.
Segundo a Piauí, Wilma Petrillo foi procurada diversas vezes pela reportagem, mas se recusou a responder. Contudo, o jornalista afirmou que recebeu uma mensagem do advogado da empresária com uma “advertência por escrito” que, caso a matéria fosse publicada, os responsáveis iriam sofrer “as medidas judiciais cabíveis”.
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