O projeto de Sam Altman, dono do ChatGPT, tem gerado grande repercussão nas redes sociais, especialmente no TikTok, após um vídeo da brasileira Caroline Silva viralizar com o título: “Fui vender meu olho”. A gravação, que foi assistida por mais 5,2 milhões de pessoas, mostra o trajeto da jovem até um dos estandes da companhia. Na mesma plataforma social, circularam imagens de filas consideráveis em São Paulo, com dezenas de pessoas interessadas em “vender” a íris.
O interesse não é à toa. A rede chamada World, liderada pela empresa Tools for Humanity (TfH), oferece 25 Worldcoins (atualmente cotadas a R$ 12,68 cada) para aqueles que aceitarem fornecer a biometria da íris durante o cadastro. O valor convertido para o real é equivalente a R$ 300.
As pessoas estão simplesmente escaneando e VENDENDO a própria íris pra uma empresa de IA pic.twitter.com/oBB7zHblCA
— Sam Luz -JOGO TAROT 🔮 (@samguaja) January 13, 2025
O processo, realizado em um dispositivo esférico prateado, denominado “orb”, coleta os dados biométricos, mas segundo a TfH, essas informações não ficariam armazenadas na máquina. Elas seriam usadas apenas para confirmar a identidade da pessoa, gerando o World ID.
O grupo retomou suas atividades de coleta no Brasil em novembro, depois de uma rápida passagem em agosto de 2023. Até o momento, mais de 10 milhões de pessoas foram verificadas no projeto, com 6,3 milhões concentrados na América do Sul.
No entanto, a proposta está sendo analisada pela ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados), que iniciou uma fiscalização desde novembro, para garantir que a operação seja segura para a privacidade dos brasileiros. A ANPD alerta que dados biométricos são extremamente sensíveis e não podem ser alterados da mesma forma que uma senha alfanumérica.
A autoridade orienta que os titulares de dados compreendam os riscos envolvidos no tratamento de informações biométricas e se informem sobre seus direitos antes de participarem de cadastros como o oferecido pela rede World.
Segundo a ANPD, a iniciativa de Altman tem colaborado com a investigação e fornecido os relatórios solicitados, que estão sendo analisados pelo órgão. No entanto, a empresa já teve suas atividades suspensas na Espanha e em Portugal por não conseguir comprovar que o processo garantisse a privacidade dos cidadãos locais.

Entenda o que é a rede World
Inicialmente chamada Worldcoin, a rede World alterou seu nome no final de 2024 para dar mais ênfase à sua proposta de autenticar identidades digitais. O principal objetivo do projeto, conforme explica Damien Kieran, chefe de privacidade do TfH, é criar uma tecnologia capaz de identificar que uma pessoa é humana, sem revelar informações sensíveis, como identidade, cor, etnia ou religião.
Essa identidade digital tem como proposta permitir a verificação de idade sem expor o usuário, o que poderia, por exemplo, impedir que menores de 13 anos se registrem em redes sociais, violando os termos de uso das plataformas.
Como é feita a criação do World ID
Para se cadastrar e receber as criptomoedas, os interessados precisam baixar o aplicativo World App, disponível na Play Store para Android e na App Store para usuários de iPhone. A empresa recomenda agendar um horário previamente, para realizar os registros, que só podem ser feitos em São Paulo, onde há 40 pontos de coleta.
“É ali que acontece a tal análise do dado biométrico que valida que esse humano é único, que esse humano nunca se verificou antes. Essas informações são processadas na Orb, enviadas para o telefone celular de cada usuário e permanentemente apagadas do dispositivo. Quando esse processo está concluído, o World ID é ativo”, explicou Rodrigo Tozzi, chefe de operações no Brasil da Tools For Humanity, ao UOL.
A empresa optou pela íris devido à sua alta precisão na identificação individual. A probabilidade de um falso positivo é de uma em 2 bilhões de tentativas. Para o reconhecimento facial, essa taxa é de uma a cada 16 milhões, e, para impressões digitais, de uma em 80 milhões.

Preocupações com a segurança de dados
A ANPD está em processo de apuração sobre o tratamento dos dados biométricos coletados pelo projeto, incluindo informações da íris, do rosto e dos olhos. A instituição de proteção de dados destaca que dados biométricos exigem proteção rigorosa devido à sua natureza única e permanente.
“Em razão dos riscos mais elevados que o tratamento desse tipo de dado pessoal pode oferecer, o legislador conferiu a eles regime de proteção mais rigoroso, limitando as hipóteses legais que autorizam o seu tratamento”, diz o órgão em nota.
No Brasil, apenas maiores de 18 anos podem se cadastrar, sendo necessário apresentar um documento com foto no momento da coleta.
Restrições e investigações em outros países
Em Portugal e na Espanha, as autoridades de proteção de dados proibiram a operação da rede World, apontando que a empresa não conseguiu provar que o tratamento dos dados biométricos era seguro para a privacidade dos cidadãos. Na Coreia do Sul, a empresa foi multada em 1,1 bilhões de wons (cerca de R$ 4,56 milhões) por violações à lei de privacidade local.
Apesar das críticas, a empresa afirmou que o processo está em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) do Brasil e com a GDPR (Lei de Proteção de Dados da União Europeia).
A TfH reforça que os dados biométricos não são armazenados. Eles seriam usados apenas para gerar um código binário, o World ID, que é criptografado e dividido em três servidores de universidades espalhadas pelo mundo.
Sucesso no Brasil e números de crescimento
Apesar das investigações e das preocupações da ANPD com a privacidade, o projeto tem mostrado grande sucesso no Brasil. Desde a reabertura dos estandes em novembro, o número de pontos de coleta no país aumentou de 8 para 40, e a quantidade de pessoas verificadas na América Latina cresceu significativamente, passando de 4 milhões para mais de 6 milhões.

Como acessar os R$ 300
Ao se cadastrar no World, o usuário recebe 25 Worldcoins, cada uma avaliada em R$ 12,68. Para resgatar o valor em moeda corrente, é necessário transferir as criptomoedas para uma corretora de criptomoedas e realizar a conversão para dinheiro. Esse processo exige atenção aos dados da transação para evitar perdas.
O financiamento do projeto é garantido por rodadas de investimento no mercado de capital de risco. Na última rodada, realizada em maio de 2023, foram levantados US$ 115 milhões, com a participação de investidores como Blockchain Capital, Andreessen Horowitz (16z), Bain Capital Crypto e Distributed Global. Sam Altman, CEO da OpenAI, é o principal investidor do projeto.
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