A série “Pacto Brutal: O Assassinato de Daniella Perez”, da HBO Max, estreia nesta quinta-feira (21), no catálogo da plataforma. A filha da autora Gloria Perez, foi assassinada aos 22 anos, a facadas, por Guilherme de Pádua e sua esposa, Paula Thomaz. Quase 30 anos depois, Gloria revisitou a história, compartilhando seus pensamentos sobre o crime. Em entrevista para a Folha de São Paulo, a dramaturga contou como começou uma investigação por conta própria e o pedido que fez à HBO para o documentário.
Gloria Perez participou ativamente das buscas, rastreando testemunhas, identificando possíveis evidências e ajudando a expor erros das autoridades brasileiras. “Eles (produtores do documentário) realmente foram muito atenciosos e fizeram uma proposta que foi o que eu sempre quis: contar a verdade, contar o que está nos autos do processo”, disse.
“Eu sabia que ela jamais iria para aquele lugar [o matagal na Barra da Tijuca] sozinha. E eu tinha que ir atrás daquelas pessoas que tinham visto o que realmente tinha acontecido, porque se a mãe não vai, quem é que vai?”, indagou.
Na época, um frentista afirmou que tinha visto Daniella ser agredida por Guilherme e colocada dentro de um carro, já desacordada, em um local próximo aos estúdios onde ambos gravavam. No entanto, nem o homem e nem a família queriam conversar com a autora. Foi quando ela decidiu colocar, debaixo da porta deles, uma foto de como o corpo de Daniella foi encontrado.
“Eu tirei forças da minha filha [para fazer isso]. Não dava para deixar ela ser achincalhada daquela maneira, pintarem uma pessoa que ela nunca foi. Você mora num país em que se a mãe não arregaça as mangas e vai atrás, muita coisa não acontece”, explicou.
Na entrevista para a colunista Monica Bergamo, Gloria afirmou que se chateou com a maneira como a imprensa tratou o caso de forma “sensacionalista”, dando voz para Guilherme de Pádua e Paula Thomaz contarem “todas as versões possíveis e imagináveis”. Na época, Pádua alegou que matou a colega por “acreditar que seu papel estava sendo reduzido, enquanto a jovem ganhava destaque“.
“Não é justo que ela tenha sido assassinada da maneira brutal que foi e ainda tenha sido descrita através das palavras de um assassino como uma pessoa louca, fora de si. Quem morreu só produz lágrimas das suas famílias e das pessoas que a amaram. Eu vi isso. Eu vi minha filha ser despessoalizada”, desabafou.
Perez, inclusive, fez um pedido especial para a HBO, antes da gravação da série. A autora solicitou que nem Pádua nem Thomaz fossem ouvidos no documentário.“Para que entrevistar agora? Para dar palco para psicopata? O que eles têm para dizer a mais do que já foi dito? Se eles tivessem alguma coisa a dizer depois do resultado do júri, eles teriam processado o Estado ou pediriam um novo julgamento. Pediram? Claro que não. Saiu barato à beça para eles”, apontou.
Guilherme aguardou o julgamento na prisão, e foi condenado em 1997. Em 1999, no entanto, recebeu a liberdade condicional e abandonou a carreira artística, vivendo uma vida longe dos holofotes. Hoje, atua como pastor evangélico numa igreja em Belo Horizonte. Thomaz teve sua pena inicial reduzida para 15 anos, mas também recebeu a liberdade condicional em 1999. Atualmente, ela mudou o sobrenome e também busca o anonimato.
Daniella Perez foi morta com 18 perfurações no corpo, quando saia de uma gravação da novela “De Corpo e Alma”, da Globo, da qual era protagonista. Na história, Daniella e Pádua interpretavam Yasmin e Bira, personagens que se envolviam amorosamente. A mãe dela era a autora da trama e, segundo Gloria, as pessoas começaram a tratar o crime como uma “sequência” da novela.
“É óbvio que você fica magoada: A tua filha acaba de sofrer uma violência horrorosa, e eu andava na rua e estava estampado nas capas das revistas, em todas as bancas, as fotos de cenas da novela. Aquelas imagens ali alimentavam a confusão de que o crime tinha sido uma continuidade da trama. Nos autos do processo não foi Bira que matou Yasmin. Foi Guilherme de Pádua. Não foi a mulher do Bira quem matou Yasmin. Foi a Paula. A vítima não é Yasmin. É a Daniella”, expôs.
No próximo dia 28 de dezembro, o assassinato de Daniella Perez completará 30 anos. No entanto, segundo a autora e mãe, a saudade só aumenta: “O tempo não apaga nada. Pelo contrário. À medida que os anos passam, à medida que o mundo se transforma, essa ausência se sublinha cada vez mais. Por exemplo, há uma revolução tecnológica, e eu fico pensando que ela não está aqui para ver. E ela era uma pessoa tão interessada em aprender essas coisas. Toda vez que eu vou viajar para um país diferente, eu sempre levo comigo a ausência dela. Ela não está ali”.
Apesar do sofrimento com a perda brutal da filha, a autora afirmou que nunca cogitou parar de escrever suas novelas. Essa foi a forma encontrada por ela de se “manter viva e sã” em meio ao caos. “Isso nem é possível, porque é uma questão de sobrevivência. Esse gesto permitiu que eu não enlouquecesse. Quando tudo isso aconteceu comigo, eu pensei: os capítulos que eu tenho de escrever vão ser a minha caixa de fósforo. E foram. Eu sobrevivi para fazer justiça para a minha filha. A minha grande força é ela. É o resgate dela. É não deixar que ninguém fizesse mais nada com ela além do que já tinham feito”, disse.
Além de Gloria Perez, a produção conta com nomes como Glória Maria, Claudia Raia, Fábio Assunção, Maurício Mattar, Cristiana Oliveira e Eri Johnson. O viúvo da atriz, Raul Gazolla, também deixou seu depoimento.
O documentário ainda traz as falas inéditas de profissionais que foram essenciais na reconstituição e solução do caso, como o promotor Piñero Filho, a testemunha principal Antonio Curado, as jornalistas Luciléia Cordovil e Elsa Boechat, além de especialistas em personalidades psicopatas. Assista ao trailer: